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O momento do Compliance Ambiental: uma análise do PL 5.442/2019

  • Foto do escritor: Bruno Teixeira Peixoto
    Bruno Teixeira Peixoto
  • 18 de set.
  • 5 min de leitura
Vista aerea de viadutos, elevados e estradas
Imagem: Freepik

Projeto de Lei Federal para regulamentar Programas de Conformidade Ambiental sintoniza a regulação brasileira com tendência mundial.


Desde o pós-pandemia (2020-2021), há uma considerável guinada nas bases da regulação dos mercados e das atividades econômicas e empresariais em direção às questões de sustentabilidade, ESG, gestão ambiental e emergência climática. É um movimento confirmado pelas posturas de fundos de investimentos e pelas alterações sobre normas regulatórias em diferentes setores econômicos, nacionais e internacionais.


Trata-se de um contexto em que consumidores, bancos, órgãos reguladores e a sociedade em geral passam a exigir com mais intensidade a implementação de boas práticas ambientais, climáticas, sociais e de governança (ESG) das empresas e companhias privadas, bem como das entidades e órgãos públicos, pois devem atender o interesse público e orientar o privado.


Na área ambiental, nota-se preocupação mundial quanto à efetiva prestação de contas (anti-greenwashing) e ao sistêmico gerenciamento de riscos e impactos ao meio ambiente e clima em organizações públicas e privadas, tanto em relação as suas atividades, processos, serviços e negócios, como - sobretudo - em termos de seus principais stakeholders.


Motivos para tal atenção não faltam, sobram. Desde os efeitos cada vez mais graves das mudanças climáticas1até os índices de corrupção e fraude ligados à gestão de setores econômicos que dependem/afetam os recursos naturais2cumprindo se falar em uma crise de integridade socioambiental e climática a ser enfrentada e regulada3.


No Brasil, tragédias estruturais, como em Mariana e Brumadinho, são marcos de desconformidade ambiental e de violação à referida integridade socioambiental. Isso porque, em suas causas, foram apontadas controvérsias sobre o cumprimento dos padrões mínimos ambientais e de segurança das barragens. São fatores inclusive levantados pelas conclusões de CPIs na Câmara dos Deputados4 e no Senado Federal5, com expressa menção a defeitos de organização nas companhias privadas envolvidas, possivelmente melhor geridos e prevenidos por intermédio de um compliance ambiental efetivo.


Justificado exatamente nestas tragédias que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Federal (PL) n. 5.442/2019, que busca regulamentar os Programas de Conformidade (Compliance) Ambiental no Brasil6. A iniciativa propõe uma série de relevantes inovações na área da regulação e controle das atividades econômicas com significativos riscos e que impactem concreta e/ou potencialmente o meio ambiente, e na prevenção de crimes e infrações ambientais e nas contratações públicas. Recentemente, a atual relatoria do PL na Câmara publicou parecer7 pela sua aprovação.


Nesse sentido, a inciativa (se aprovada e oficializada) pode sintonizar a legislação ambiental do Brasil com as boas práticas internacionais, repercutindo, inclusive, no combate à corrupção socioambiental, meta do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável n. 16, da Agenda 2030, da ONU. O ODS 16 preconiza “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”.


O paradigma tradicional (e ainda predominante) da regulação ambiental brasileira é ainda vinculado ao comando e controle estatal, com poucas (ou quase nada) estratégias regulatórias ambientais de compliance, enforcement e incentivos. Sobre o tema, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) publicou em 2023 nova edição do estudo "Environmental Rule of Law"8no qual reiterou a perspectiva de 2019, para a qual a implementação efetiva de políticas e normas ambientais exige estratégias regulatórias de governança, compliance e fiscalização sistêmica entre setores público e privado.


Aplicando definições do Decreto Federal n. 8.420/2015 (atual Decreto Federal n. 11.129/2022), que regulamentou a Lei n. 12.846/2013 – Lei Anticorrupção, e calcado no artigo 23, VI, da Constituição Federal (competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de proteger o meio ambiente e combater a poluição), o projeto sugere norma geral regulamentadora da estrutura e aplicação dos Programas de Conformidade Ambiental.


Como função primordial, o artigo 2º do PL prevê o Programa de Conformidade (Compliance) Ambiental:


“(...) no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de conformidade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar, prevenir e sanar irregularidades e atos ilícitos ao meio ambiente”.

Assim, as pessoas jurídicas, públicas ou privadas, que explorem atividade econômica potencialmente lesiva ao meio ambiente deverão implementar tais programas, que terão de ser considerados pelo Poder Público quando da imposição de sanções penais e administrativas previstas na legislação ambiental em vigor, como também irão condicionar eventuais subvenções e financiamentos públicos à existência do mecanismo.


O projeto inclui alterações na Lei Federal n. 9.605/1998 – Lei de Crimes e Infrações Administrativas Ambientais -, uma vez que dispõe, como uma das diretrizes do programa, o monitoramento contínuo do programa visando seu aperfeiçoamento na prevenção, detecção e combate à ocorrência dos atos lesivos previstos na respectiva lei ambiental, inserindo o Programa de Conformidade Ambiental como uma das circunstâncias atenuantes na aplicação de sanções por crimes e infrações ambientais.


Para além disso, o PL ainda modifica a Lei Federal n. 6.938/1981 – Lei da Política Nacional do Meio Ambiente -, em seu artigo 12, sugerindo que passe a constar: “As entidades e órgãos de financiamento e incentivos governamentais

condicionarão a aprovação de projetos habilitados a esses benefícios: I – ao licenciamento, na forma desta Lei; II – ao cumprimento das normas, dos critérios e dos padrões expedidos pelo CONAMA; e III – à existência de programa de conformidade ambiental, nos termos da legislação em vigor”.

Dentre as diretrizes que nortearão o Programa de Conformidade Ambiental, estão: 


a) comprometimento da alta direção da empresa; 

b) padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de conformidade, aplicáveis a todos os membros; 

c) treinamentos periódicos; 

d) análise de riscos para realizar adaptações necessárias; 

e) canais de denúncia e proteção a denunciantes; 

f) monitoramento contínuo do programa visando seu aperfeiçoamento na prevenção, detecção e combate à ocorrência dos atos lesivos ambientais; e 

g) medidas disciplinares em caso de violações, entre outras.


A avaliação dos programas será efetuada entre o setor público e o privado, tanto por autoridade certificadora independente e credenciada, como pelo órgão público competente. Demais diretrizes deverão ser objeto de regulamentação pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, o que, a priori, deverá ser replicado nos níveis Estadual e Municipal.


Cabe destacar que o PL ainda prevê a exigência do Programa de Conformidade Ambiental nas parcerias público-privadas e nas contratações públicas de obras, serviços, concessões e permissões de serviço público de contratos superiores a R$ 10.000.000,00, sugerindo novo instrumento de regulação inclusive dos atos da Administração Pública. Uma oportuna replicação da exigência destes Programas espera-se que ocorra no âmbito de outro Projeto de Lei n. 2.159/2021 – Lei Geral do Licenciamento Ambiental -, com o fim exclusivo de incluí-lo nos requisitos de concessão das licenças e autorizações ambientais.


Com efeito, a ideia central do PL é incentivar a ampla adoção dos Programas de Conformidade Ambiental, a fim de que se atinja um cenário de maior transparência, integridade e conformidade com a lei e padrões ambientais exigidos, garantindo o efetivo controle e prevenção dos riscos nas atividades que mais impactem o meio ambiente.


Certamente, com o devido apoio do Legislativo Federal, esta inovação legislativa pode representar avanço para a regulação das atividades que impactam o meio ambiente e demais ilícitos ambientais decorrentes, além de formatar novo instrumento anticorrupção e fraude, agregando forças estruturais na busca de um desenvolvimento nacional sustentável.


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Artigo adaptado do original, publicado em 06/02/2020, na página do JOTA. também publicado no LinkedIn.

Autor: Bruno Teixeira Peixoto

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