O Pacto pela Transformação Ecológica e a Agenda ESG
- Bruno Teixeira Peixoto

- 19 de set.
- 6 min de leitura

Com tons de "Green New Deal", compromisso histórico entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário traz importantes perspectivas ao fomento da agenda ESG no Brasil.
Divulgado oficialmente nesta quarta (21/08), o Pacto pela Transformação Ecológica é de fato um marco para o compromisso de ações sustentáveis coordenadas entre os três Poderes no Brasil. Dentre os objetivos traçados, está a promoção da sustentabilidade ecológica, do desenvolvimento econômico sustentável e da justiça social, ambiental e climática1.
Entre as prioridades elencadas pelo Pacto2, estão as seguintes:
O Poder Executivo ampliar o financiamento e reduzir o custo do crédito para setores, projetos e práticas sustentáveis;
O Poder Legislativo priorizar projetos de lei relacionados aos temas do pacto, como a aprovação do marco legal do mercado de carbono, da produção de energia eólica no mar e dos biocombustíveis;
O Poder Judiciário adotar medidas para agilizar demandas judiciais que envolvam a temática ambiental, fundiária e climática, inclusive com a definição de metas e protocolos do Conselho Nacional de Justiça;
Os poderes Executivo e Judiciário, conjuntamente, integrar bancos de dados imobiliários, ambientais, cadastrais e fiscais, com dados georreferenciados, para garantir segurança jurídica sobre a titularidade das terras públicas e privadas no país e destravar investimentos; e
Os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário adotar medidas de gestão para reduzir os impactos diretos de suas atividades sobre o meio ambiente, como licitações sustentáveis, redução de demanda por recursos naturais, eficiência energética e destinação adequada de resíduos.
Trata-se de medida de extrema relevância e que ressalta um objetivo constitucional do Estado brasileiro: o desenvolvimento nacional sustentável. Ele está previsto pela Constituição Federal de 1988, com destaque, nos artigos 3º, III (objetivo da garantia do desenvolvimento nacional), 170, VI (ordem econômica pautada pela defesa do meio ambiente), 183 (ordenamento urbano sustentável), 192 (sistema financeiro nacional e interesse coletivo), 225 (proteção intergeracional do meio ambiente e do clima) e 219 (mercado interno e desenvolvimento), entre outros.
Retomando o título: mas, afinal, o que há neste compromisso estrutural em relação à agenda ESG (Environmental, Social and Governance) especificamente?
Em leitura mais atenta e sistemática, a grande maioria dos temas e tópicos definidos pelo Pacto se relacionam, direta ou indiretamente, com o fomento da responsabilidade e dos deveres de governança e gestão de riscos e impactos socioambientais, climáticos e humanos em atividades, projetos e empreendimentos, tanto no setor público como na área privada.
No entanto, considerando o atual estágio de necessária ampliação e maturidade da agenda ESG no Brasil, importante destacar temáticas específicas do Pacto recém-lançado que possuem funções decisivas para o ambiente regulatório de ESG no País.
Inclusive, este Pacto oficializado pelos três Poderes da República tem também direta afinidade com o Plano de Transformação Ecológica (PTE)3, já em vigor e lançado em 2023, durante a COP-28, pelo Ministério da Fazenda.
Perspectivas ESG do Pacto pela Transformação Ecológica
Especificamente no seu Eixo III de "Desenvolvimento sustentável com justiça social, ambiental e climática"4, são relevantes no universo das agendas de sustentabilidade corporativa e padrões ESG as seguintes medidas estruturais e incumbidas aos três Poderes da República:
Uso da capacidade institucional e do poder de compra do Estado para fomentar a inovação, a redução das desigualdades e o desenvolvimento sustentável;
Elaboração da Taxonomia Sustentável Brasileira, sistema nacional de classificação que define, de forma objetiva e com base científica, atividades, ativos ou categorias de projetos que contribuem para objetivos climáticos, ambientais ou sociais;
Ampliação do financiamento, redução do custo do crédito e aprimoramento de mecanismos de garantia e seguros para setores, projetos e práticas sustentáveis;
Promoção de atividades econômicas geradoras de trabalho de qualidade e compatíveis com a conservação da diversidade ecológica dos biomas brasileiros, bem como incentivo à reutilização, à reciclagem e à redução do desperdício; e
Regulamentação e controle efetivo da cadeia do ouro e seus insumos, para promover o rastreamento do produto e coibir o garimpo ilegal.
As perspectivas de interligação destas ações do Pacto com a agenda ESG são diversas. A começar pelo "uso do poder de compra do Estado" por meio de licitações sustentáveis, a exemplo de compras públicas e contratações estatais focadas em critérios, indicadores ou boas práticas consagradas de ESG pelos licitantes, questão, inclusive, já prevista pela Lei Federal nº 14.133/2021 (Lei Geral de Licitações) no art. 144 (remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental)5, medida que poderá receber regulamentação específica a partir da oficialização deste compromisso por parte dos Poderes Públicos.
Nesse sentido, relevante também é o Decreto Federal nº 12.063/2024, que criou o Programa Selo Verde Brasil6, tem por objetivo elaborar diretrizes nacionais para a normalização e a certificação de produtos e de serviços que comprovadamente atendam a requisitos de sustentabilidade pré-definidos. Uma das diretrizes previstas no Selo é fortalecer o uso dos critérios Ambiental, Social e de Governança – ESG.
Em relação à meta de "elaboração da Taxonomia Sustentável Brasileira", trata-se de outra temática diretamente vinculada à agenda ESG, a qual, inclusive, já foi aprovada na União Europeia7, com a definição de listagem de atividades verdes ou sustentáveis, pautadas em critérios previamente fixados em impactos ambientais, climáticos e sociais, os quais funcionam como condicionantes ao recebimento e aprovação de financiamentos e investimentos.
Sobre a Taxonomia Sustentável Brasileira, em março foi publicado o Decreto Federal nº 11.961/2024, o qual criou o Comitê Interinstitucional da Taxonomia Sustentável Brasileira8, voltado a coordenar o desenvolvimento e a implementação da Taxonomia Sustentável Brasileira - TSB. Este mecanismo é crucial na orientação ESG de projetos no Brasil.
Quanto à meta de "ampliação do financiamento e aprimoramento de mecanismos de garantia e seguros para projetos sustentáveis", cabe falar da Circular nº 666/2022 da SUSEP (Superintendência de Seguros Privados)9, que está em vigor e passou a exigir de entidades seguradoras no Brasil o atendimento a requisitos de sustentabilidade, como gestão de riscos ambientais, climáticos, sociais e de interesse comum, além de relatórios de sustentabilidade e realização de estudo de materialidade. Esta é outra frente que poderá ser ampliada a partir da assinatura deste Pacto Sustentável dos três Poderes brasileiros.
Cabe ainda falar do tema ESG no mercado de capitais, a partir da Resolução nº 193/2023, publicada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que exigirá de modo obrigatório em 2026 a publicação detalhada de Relatórios sobre Informações de Sustentabilidade e ESG10. No mercado financeiro, também vale citar a Resolução 4.945/2021 do BACEN11, que exige dos bancos e instituições financeiras políticas socioambientais e climáticas de gestão de riscos.
No item de "promoção de atividades econômicas geradoras de trabalho de qualidade e de incentivo à reciclagem", importante relacioná-lo com os recentes Decretos Federais nº 11.413/2023 e 11.414/2023, que criaram o Sistema de Créditos de Reciclagem12, aplicável para o setor público e também para empresas e companhias privadas.
Por fim, o compromisso da "regulamentação e controle da cadeia do ouro e promoção do rastreamento e coibição do garimpo ilegal" tem grande incidência em questões da agenda ESG de responsabilidade corporativa, com especial atenção aos padrões de controle em complexas cadeias de valor e de suprimentos em empresas e companhias privadas. Este é tema sensível e de importante aplicação sobre deveres ESG de "due diligence" em direitos socioambientais e humanos, tema que também já é regra na União Europeia13, e que precisa avançar concretamente no cenário brasileiro.
Relação com o Eixo de Finanças Sustentáveis do Plano de Transformação Ecológica já em vigor
Este recém-lançado Pacto pela Transformação Ecológica, assinado pelos três Poderes da República, não apenas tem semelhança de nomenclatura, como também se relaciona com conteúdos e eixos do já lançado Plano de Transformação Ecológica (PTE) instituído pelo Governo Federal, por meio do Ministério da Fazenda em 2023.
Importantes são os tópicos inseridos no Eixo 1 de "Finanças Sustentáveis" do Plano desenvolvido pelo Ministério da Fazenda14. Neste Eixo, há compromissos ligados com "Mercado Regulado de Carbono", "Taxonomia Sustentável" e "Divulgação de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade no Mercado de Capitais", pautas também abarcadas pelo Pacto pela Transformação Ecológica oficializado pelos Chefes dos três Poderes.
Como se vê, tanto o Pacto Republicano recém-lançado como o Plano de Transformação já criado pelo Executivo Federal visam promover um modelo sustentável de desenvolvimento econômico, social e ambiental, com dinâmicas estruturais na realidade do País.
E dentre as medidas destes importantes compromissos constam ações ligadas à agenda ESG (Environmental, Social and Governance), desde estratégias para investimentos que promovam práticas sustentáveis e incentivem as empresas a adotar padrões ambientais, sociais e de governança mais responsáveis, até regulamentações essenciais em controle da cadeia de ouro e garimpo e do mercado de carbono. A agenda ESG indica despontar como temática integrante e necessária a projeto de desenvolvimento nacional sustentável, o que sublinha a relevância sobre o seu avanço e maturidade no ambiente regulatório do Brasil.
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Artigo originalmente publicado no LinkedIn.
Autor: Bruno Teixeira Peixoto



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