Regulação ESG nos Seguros: Circular 666/2022 SUSEP
- Bruno Teixeira Peixoto

- 18 de set.
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Em vigor desde agosto de 2022, a Circular n. 666/2022, publicada pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), consolida tendência mundial de regulação ESG (Environmental, Social and Governance) sobre o setor de seguros, alinhando o Brasil com as melhores estratégias para sustentabilidade.
Nos últimos anos, evidente é a necessidade de maior atuação do mercado de seguros em matéria de mudanças climáticas, pautas socioambientais e de direitos humanos, de modo a promover um paradigma mais sustentável de economia e mercado. Este fato demonstra a relevância que a Circular editada pela SUSEP deve assumir no cenário brasileiro.
Não bastassem os prejuízos sociais e humanos causados pela crise socioambiental e climática em curso, números recentemente divulgados1 indicam que cerca de US$ 250 bilhões de dólares em 2023 estiveram ligados a perdas geradas por desastres naturais e climáticos. Deste montante, nem a metade (cerca de US$ 98 bilhões) se relacionou ao total efetivamente "segurado" por empresas e entidades seguradoras.
No Brasil, o cenário não se distingue, uma vez que cerca de US$ 555 milhões de dólares foram perdas por desastres do clima. O setor de seguros parece não ter dimensionado efetivamente a emergência do clima. Além disso, há episódios recentes envolvendo seguradoras e atividades seguradas com vinculações a áreas de desmatamento ilegal2 e a potenciais violações a direitos sociais3.
Nesse contexto, nunca os agentes seguradores foram tão importantes para a prevenção, monitoramento e reparação de riscos e perdas materiais e financeiras em matéria ambiental, climática, social e de direitos humanos. E a recente Circular 666/2022 da SUSEP caminha exatamente nesta direção, ao menos é o que se extraí quando analisadas suas diretrizes e requisitos.
Publicada em 27 de junho de 2022 e em vigor desde 1º de agosto do mesmo ano, a Circular n. 666 da SUSEP instituiu no Brasil os "Requisitos de Sustentabilidade", a serem cumpridos pelas pelas sociedades seguradoras, entidades abertas de previdência complementar (EAPCs), sociedades de capitalização e resseguradores locais.
Em síntese, o regulamento da SUSEP exige o atendimento de 4 (quatro) principais requisitos de sustentabilidade pelas entidades e empresas seguradoras: 1) Política de Sustentabilidade; 2) Gestão de Riscos de Sustentabilidade; 3) Estudo de Materialidade de Riscos de Sustentabilidade; e 4) Relatório Anual de Sustentabilidade.
1) POLÍTICA DE SUSTENTABILIDADE
Conforme o art. 8º da Circular 666 da SUSEP, as entidades e empresas seguradoras deverão publicar uma Política de Sustentabilidade, com a qual estabeleçam princípios e diretrizes destinados a garantir que aspectos de sustentabilidade, incluindo riscos e oportunidades, sejam considerados nos seus negócios e no seu relacionamento com partes interessadas.
Como conteúdo, a Política deverá abordar: I - promoção dos direitos e garantias fundamentais e dos interesses comuns; II - preservação do meio ambiente; III - redução dos impactos ocasionados por intempéries frequentes e severas ou por alterações ambientais de longo prazo; IV - transição para uma economia de baixo carbono; e V - promoção de uma sociedade mais resiliente e inclusiva. A Política ainda poderá tratar da participação de partes interessadas (stakeholders) nas ações de sustentabilidade das seguradoras.
2) GESTÃO DE RISCOS DE SUSTENTABILIDADE
O segundo requisito definido pelo art. 3º da Circular 666 da SUSEP é a Gestão de Riscos de Sustentabilidade, a qual deverá ser compatível com o porte da supervisionada, a natureza e a complexidade de suas operações e com a materialidade dos riscos de sustentabilidade a que se encontra exposta.
Através desta Gestão, as seguradoras terão de desenvolver metodologias, processos, procedimentos e controles específicos para identificar, avaliar, classificar, mensurar, tratar, monitorar e reportar, de forma tempestiva, os riscos de sustentabilidade a que se encontra exposta. Além disso, as entidades seguradoras deverão estabelecer limites para concentração de riscos e/ou restrições para a realização de negócios que considerem a exposição de setores econômicos, regiões geográficas e produtos a riscos de sustentabilidade.
Para a Circular, são Riscos de Sustentabilidade as ocorrências de perdas ocasionadas por eventos associados a alterações climáticas, transição de baixo carbono, degradações ambientais e violações de direitos e garantias fundamentais ou a atos lesivos a interesse comum e a grupos determinados.
Toda esta frente de Gestão de Riscos de Sustentabilidade poderá ser adaptada pela seguradora em sua já existente Estrutura de Gestão de Riscos (EGR) e Sistema de Controles Internos (SCI) exigidos pela Resolução CNSP 416/2021.
3) ESTUDO DE MATERIALIDADE DE RISCOS DE SUSTENTABILIDADE
O terceiro requisito exigido pela Circular da Susep é o Estudo de Materialidade de Riscos de Sustentabilidade, conforme o art. 3º, § 1º, do regulamento. Trata-se de estudo para identificar, avaliar e classificar, por níveis de materialidade, os riscos de sustentabilidade a que se encontrem expostas, levando em consideração as características de suas atividades, operações, produtos, serviços, clientes, fornecedores e prestadores de serviços.
Nesse sentido, fixa a Circular que a classificação dos riscos de sustentabilidade por níveis de materialidade deverá ter por base o valor resultante da combinação de sua probabilidade e impacto estimados, devendo um risco ser considerado imaterial somente se esse valor se situar abaixo do parâmetro mínimo de relevância definido pela empresa ou entidade seguradora.
4) RELATÓRIO ANUAL DE SUSTENTABILIDADE
O quarto e último requisito exigido pela Circular 666/22 da SUSEP é a publicação anual do Relatório de Sustentabilidade, com o qual, segundo o art. 15 do regulamento, as seguradoras deverão divulgar as ações promovidas pela Política de Sustentabilidade, explicitando, se houver, os resultados obtidos no exercício anterior e os esperados para o atual e também os aspectos mais relevantes relativos à Gestão dos Riscos de Sustentabilidade a que se encontram expostas, destacando os riscos e as medidas de controle.
Os prazos de cumprimento da publicação da Política de Sustentabilidade para as seguradoras de todos os Segmentos (S1, S2, S3 e S4) já se esgotaram. Os prazos da divulgação da Gestão de Riscos e do Estudo de Materialidade de Riscos para as seguradoras S1 (31/12/2023) e S2 (28/02/2024) também se encerraram.
Já para as entidades e seguradoras de Segmentos S3 e S4, a publicação institucional da Gestão de Riscos de Sustentabilidade e do Estudo de Materialidade desses Riscos se esgotará no prazo de 30/04/2024.
Por fim, a publicação do Relatório Anual de Sustentabilidade deverá ser cumprida até 30/06/2024, para as supervisionadas do Segmento S1, e até 30/06/2025, para as seguradoras enquadradas nos Segmentos S2, S3 e S4.
Os requisitos de sustentabilidade exigidos e promovidos pela Circular adentram em hora oportuna o quadro regulatório securitário, tanto para as entidades e empresas seguradoras, como também - e sobretudo - para as respectivas atividades, projetos e investimentos segurados.
É sempre válido ressaltar que os riscos são o centro dos seguros. E diante da complexidade dos efeitos dos desafios socioambientais e climáticos, fatores como a sinistralidade e a cobertura securitária tornam-se ainda mais incertos e de difícil mensuração. Estruturas de riscos e reportes ESG, como as exigidas pela SUSEP, representam, portanto, mecanismos essenciais aos seguros.
Apesar da necessidade sempre presente de adaptação e absorção efetiva pelo setor em questão, a agenda ESG (Environmental, Social and Governance) tem na Circular 666 de 2022 da SUSEP a figura de um importante mecanismo regulatório setorial de sustentabilidade, que insere o mercado de seguros - ainda que tardiamente - na complexa tarefa de mitigar e controlar riscos e perdas advindas de fatores socioambientais e climáticos.
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Artigo originalmente publicado no LinkedIn.
Autor: Bruno Teixeira Peixoto



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