ESG está vivo
- Bruno Teixeira Peixoto

- 17 de set.
- 5 min de leitura

Apontar ou desejar o fim da agenda não implica sua derrocada, senão confirma a sua - ainda - importante e séria discussão nos setores público e privado.
"Sustentabilidade não é ESG", "ESG morreu", "ESG perdeu sentido", "ESG está ideologizado" ou "ESG é puro greenwashing". Todos são chamados de recentes análises, colunas, "artigos" e manifestos dos mais diferentes formatos e vertentes.
Independentemente destas discussões "acaloradas" e de cansativos "debates estéreis e terminológicos", uma coisa é certa: ESG está vivo e em 2024 parece mais receber progressivo "amadurecimento". Aos poucos, é verdade.
Ainda que a agenda ESG esteja sofrendo ataques "de morte" ou posta em suposto "ciclo encerrado", é preciso refletir acerca dos lugares de algumas questões e também destacar que tal movimento, nos setores público e privado, tanto no Brasil como em outros países, tem gerados seus efeitos e impactos concretos, o que tende a apontar mais para a sua evolução que para seu fim.
O termo ESG é por natureza amplo e dependente de uma conjugação de ações e medidas para a sua consagração. Segundo amplamente divulgado por especialistas, autores e instituições, o acrônimo ESG, das palavras em inglês "Environmental", "Social" e "Governance", é globalmente difundido a partir do documento "Who Cares Wins", publicado em 2004, pelo Pacto Global das Nações Unidas, em conjunto com uma série de instituições financeiras. Nele, em tradução livre, ESG representaria "a integração e incorporação dos aspectos ambientais, sociais e de governança (ESG) na gestão e em tomadas de decisão das organizações, assim como para aferição e critérios em investimentos sustentáveis e favoráveis a todos os stakeholders"1.
Como orienta o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), ESG seria uma sigla para destacar um conjunto de práticas e ferramentas que serve para avaliar a sustentabilidade corporativa e oferecer orientações que ajudem as lideranças a concretizar a integração dos aspectos ambientais, sociais e de governança em sua gestão e processos. ESG, para o instituto, seria ainda um meio para que empresas e organizações atinjam melhores desempenhos em sustentabilidade corporativa2, performance que contribuirá com a sustentabilidade em sentido amplo, base ao desenvolvimento sustentável.
Logo, muito além do que apenas mais uma variável para investimentos ditos sustentáveis, temos que o ESG representaria legítima estratégia para que empresas, organizações (inclusive instituições públicas, por que não?), projetos, atividades e negócios sejam gerenciados, desenvolvidos e executados com observância aos seus impactos, riscos e oportunidades em temas ambientais, climáticos, sociais e de governança, em conjunto com o viés econômico. Trata-se, portanto, de um mecanismo de governança e controle organizacional, de orientação das atividades econômicas em direção à sustentabilidade.
Dadas essas suas funções, uma estratégia ESG em uma empresa não pode - nem deve - se esgotar ou ter seu ciclo encerrado ou absorvido por função distinta ou nomenclatura diversa. A internalização do ESG não o tornará irrelevante. Pelo contrário, assim como ocorreu com as estruturas e programas de compliance e de LGPD - que não morreram e seguem exigidos amplamente em organogramas e mercados mundiais -, estratégias, políticas e programas ESG cada vez mais farão parte das estruturas de governança de empresas e companhias, inclusive, estão sendo internalizadas com grandes impactos em relevantes ambientes regulatórios, como no Brasil e na União Europeia, entre outros.
Bem, questiona-se: Estaria o ESG morto/desgastado mesmo diante de um conjunto relevante de regulações cujas diretrizes replicam seus objetivos, apenas como exemplo, pela União Europeia3 e pelo Brasil4? Se um dos fins da agenda ESG é - e se concentra desde seu "despertar" - exigir de empresas, bancos e setores econômicos impactantes e complexos maiores controles e políticas em riscos sociais, ambientais e de governança, por que razão seu ciclo estaria encerrado/desgastado face a sua afirmação em normas e regulamentos estatais?
A agenda ESG, como visto, transcendeu o mercado financeiro e os critérios de investimentos para invadir e devolver luzes - ainda bem - para a importante figura jurídica da responsabilidade climática, socioambiental e de direitos humanos de empresas, bancos e demais entidades privadas. Ainda exaltá-lo como apenas mecanismo de mercado e de fundos de investimentos é subestimar os seus efeitos e a capacidade de mudança como agenda. Há litígios climáticos movidos em face de corporações que vêm exigindo cumprimento de deveres ESG no contexto de devidas diligências sobre riscos para o clima e violações de direitos humanos e sociais5.
Para além da regulação, números recentes confirmam que 91% das companhias no mercado brasileiro divulgam relatórios ESG6, com a contradição de que 98% dos investidores nacionais apontam haver greenwashing em tais relatórios7. Aí está teor vívido do ESG, a premissa de sua pertinência: contrapor o padrão de empresas e seus agentes econômicos em direção à sustentabilidade. O que dizer, então, do avanço do ESG para o mercado consumidor8.
Cumpre distinguirmos as críticas sobre um potencial "desgaste" da pauta, das análises que decretam ad hoc a sua morte ou encerramento. Deixar de se utilizar do termo "ESG" ou "ASG" não representará o fim da agenda, tampouco a sua substituição por "sustentabilidade corporativa". Isso representa, na verdade, escape, em muitos dos casos, de empresas cujas medidas não atendam suficientemente à integração sistêmica de temas ambientais, sociais e de governança de modo equânime e eficiente, na forma como a ideia concreta de ESG exige e almeja. Ou seja, beira-se ao eventual greenwashing a alteração de ocasião dos conceitos, signos, nomenclaturas utilizadas, desenvolvidas e divulgadas em estratégias e programas ESG empresariais ineficazes.
As estratégias ESG não deixarão de existir ou terão sua finalidade "atingida" em absoluto por determinada escala, pois não há temporalidade para ações e políticas com este fim. Isso vai de encontro com as suas premissas e objetivos primordiais, quais sejam, tornar-se uma ação cíclica, evolutiva e permanente e se internalizar na cultura e no propósito das organizações e dos atores que com ela e em razão dela desenvolvem os negócios, projetos e demais atividades econômicas. ESG deve ser baliza permanente da atividade empresarial, deve transformá-la em termos quantitativos e qualitativos.
Diferentemente de decretações de esgotamento e fim do ESG, o que necessita de reflexão é a difusão incompreendida - e por vezes intencional - do termo ESG para toda e qualquer iniciativa empresarial que, a despeito de suas limitações e ineficiências, é apontada como sustentável. Enquanto entusiastas e praticantes da agenda, matar ou encerrar a área ou termo ESG não nos salvará deste compromisso de reafirmar o sentido do movimento e da propagação de seus impactos e efeitos nas empresas, organizações e em toda sociedade.
Não nos esqueçamos que o greenwashing já existia há décadas antes da sobrevinda do ESG. A propósito, talvez uma das principais razões de existir do ESG - senão a mais relevante - é combater as práticas subversivas e fraudulentas de washings, seja no mercado financeiro; seja nas estruturas e políticas empresariais.
Morto o ESG, o que faremos com o greenwashing? Usa-se um novo acrônimo para, após seu morticínio, colocarmos outro no mesmo lugar? Está na hora da agenda receber mais engajamento e evolução, na busca de aprimoramento, e não o contrário.
Atenção a todos os navegantes: jogar contra a agenda ESG é greenwashing...
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Artigo originalmente publicado no LinkedIn
Autor: Bruno Teixeira Peixoto



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