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Onde está a emergência climática na "nova" lei de licenciamento ambiental?

  • Foto do escritor: Bruno Teixeira Peixoto
    Bruno Teixeira Peixoto
  • 22 de set.
  • 6 min de leitura
Cartaz com os dizeres SOS
Imagem: Freepik

Mesmo com 63 vetos presidenciais, Lei Federal nº 15.190 de 2025 não possui uma "vírgula" sobre mudanças climáticas, muito menos tratamento de impactos climáticos.


No último mês de agosto, o Projeto de Lei 2.159/2021, relativo à Lei Geral do Licenciamento Ambiental, foi aprovado na Câmara dos Deputados, recebendo a correspondente aprovação pela Presidência da República, havendo, porém, mais de 60 vetos em diversos dispositivos e tópicos propostos pelo Congresso Nacional.


Como resultado, publicou-se a Lei Federal nº 15.190, de 08 de agosto de 2025, dispondo sobre o Licenciamento Ambiental no Brasil. Além disso, o Governo Federal remeteu nova proposta de Projeto de Lei com textos ajustados para apreciação do Congresso, o qual ainda avaliará os mencionados trechos dos mais de 60 vetos da Presidência.


No texto final sancionado da Lei 15.190/2025, houve 63 vetos pela Presidência da República, dentre eles o ajuste de questões como a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso "LAC" somente para atividades e empreendimentos com nível baixo de potencial poluidor, veto à dispensa do licenciamento ambiental para produtores rurais com Cadastro Ambiental Rural (CAR) ainda pendente de análise pelos órgãos ambientais estaduais, entre outras medidas que se mostram em linha com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).


Mas e a pauta climática, onde estaria? Em uma realidade cada vez mais desafiada por extremos climáticos em diversas regiões do Brasil, não seria no licenciamento ambiental (o mais importante mecanismo de regulação ambiental do país) que os impactos climáticos deverão ser considerados, abordados e tratados em projetos e atividades econômicas?


A resposta é um rotundo não. Inexiste qualquer menção ou trecho sobre o tema, não apenas no anterior Projeto de Lei 2159/2021 do Congresso, como também na Lei 15.190/2025.


Apesar da manifesta omissão sobre os impactos climáticos na "nova" (nem tão nova pois o PL remete ao ano de 2004 - ! ) lei geral do licenciamento ambiental brasileira, existe um movimento em ascensão de entes federativos no país, de órgãos públicos ambientais e do Poder Judiciário em decisões relevantes em direção à concreta e sistêmica inserção das mudanças climáticas nos licenciamentos e nos respectivos estudos e avaliações prévias de impacto ambiental para grandes projetos, atividades e empreendimentos.


Segundo pesquisa coordenada pela Dra. Danielle de Andrade Moreira, junto ao JUMA (PUC-Rio) grupo de pesquisa "Direito, Ambiente e Justiça no Antropoceno", 18 (dezoito) entes federados no Brasil possuem normas que preveem explicitamente a consideração da variável climática no licenciamento ambiental, entre eles menções específicas outras genéricas, sem haver uma uniformidade normativa que aborde de modo estrutural a temática.


Um dos exemplos que podem ser mencionados de abordagem mais explícita e específica está no Paraná, por meio do órgão estadual Instituto Água e Terra (IAT), com a Portaria nº 42, de 2022, a qual instituiu o chamado "Diagnóstico Climático" em Estudos de Impacto Ambiental - EIA, no âmbito do licenciamento ambiental, em consonância com a Política Estadual sobre Mudança do Clima do estado (Lei estadual nº 17.133 de 2012).


Segundo o art. 3º da Portaria do IAT-PR, o objetivo do Diagnóstico Climático é estabelecer critérios mensuráveis, verificáveis e passíveis de serem informados acerca dos potenciais impactos climáticos da atividade em licenciamento, de modo a permitir a avaliação da sua viabilidade, de eventuais alternativas tecnológicas e locacionais, bem como a avaliação e monitoramento das medidas de mitigação e compensação e dos programas ambientais propostos e implementados. No mesmo regulamento, o art. 2º dispõe que o


Diagnóstico Climático se refere a estudos a serem apresentados pelo setor empresarial com as informações referentes à atividade em licenciamento, suas emissões, reduções, compensações e impactos nos serviços ecossistêmicos relacionados ao clima. 


Em relação ao escopo do referido Diagnóstico, o art. 4º prevê que o mecanismo deverá permitir identificar e mensurar os impactos que a implementação, operação e desativação de tais empreendimentos podem trazer ao clima, seja em razão da emissão de GEE, seja em razão do seu impacto nos serviços ecossistêmicos importantes para a regulação climática, de modo a também assegurar a adequada análise de alternativas locacionais e tecnológicas em uma fase de eventual aprovação do empreendimento, e a implementação de medidas de mitigação e compensação nas fases de instalação, operação e desativação.


Quanto à fundamentação técnica e científica do mecanismo, a Portaria 42/2022 do IAT-PR ainda define que o aludido Diagnóstico deve estar fundamentado pelo Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), além da análise dos impactos que potencializam as consequências das mudanças climáticas em âmbito local/regional, de modo a expressar obrigatoriamente as emissões poluentes de Escopo 1, 2 e 3, a serem estimadas com base no nível de atividade do empreendimento e orientadas pela metodologia GHG Protocol (Greenhouse Gas Protocol), desenvolvido pelo World Resources Institute (WRI) e pelo World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), referência global no tema.


Cabe ainda mencionar a recente guinada do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), competente pela fiscalização ambiental e pelo licenciamento em nível federal, em avançar na consideração da variável climática na avaliação de impactos e no licenciamento de grandes atividades e projetos com significativos impactos socioambientais e intensivas emissões de gases de efeito estufa (GEE).


Em parecer técnico de análise para concessão de licença ambiental para a Petrobras, envolvendo a 4ª etapa de exploração do pré-sal na Bacia de Santos, o Ibama determinou à empresa o desenvolvimento e comprovação de programa específico em termos de impactos de mudanças climáticas vinculado às etapas de operação da atividade, com destaque para necessidade de implementação de maior transparência de informações relacionadas às emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) do empreendimento, bem como de execução de medidas de mitigação, monitoramento e compensação dos impactos climáticos. 


Por meio do referido empreendimento na costa brasileira, a Petrobras estima uma produção média de 123 mil m3/dia de petróleo [quase 800 mil barris por dia] e de 75 milhões m3/dia de gás fóssil. Indiscutível que o Ibama, dentro de sua constitucional discricionariedade técnica e administrativa, tenha o dever de considerar todos os impactos diretos e indiretos do projeto, nestes incluídos os climáticos, em especial para medidas de mitigação e adaptação.


Ainda em nível federal, também recentemente o Ibama publicou modelo de Termo de Referência (TR) para Estudo de Impacto Ambiental na avaliação de licenças para usinas termelétricas, no qual se inseriu o componente de avaliação de impacto climático.


Nos termos da iniciativa do Ibama, o modelo de Termo de Referência a ser aplicado para novos empreendimentos termelétricos estabelece diretrizes de temas como: i) Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE); ii) Impactos cumulativos e sinérgicos sobre o meio ambiente; e iii) Vulnerabilidades e riscos associados às mudanças climáticas. Trata-se de fundamental melhoria que sintoniza a atuação regulatória federal do Ibama em licenciamentos com as melhores práticas de mitigação e controle de impactos climáticos em atividades com significativos efeitos negativos para a estabilidade do sistema climático. 


No mesmo sentido, com a finalidade de se avançar em regulamentos no Brasil que definam como obrigatória a compensação, abatimento e ou mitigação das emissões de GEE em empreendimentos a serem licenciados, o Ibama solicitou ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) o planejamento para a elaboração de regramento próprio sobre a temática, com o foco na publicação de Instrução Normativa para o assunto.


Há ainda uma expectativa de que, dentro dos estudos em curso para a atualização da Lei Federal nº 12.187/2009 (Política Nacional sobre Mudança do Clima) haja uma maior regulamentação, com detalhes e parâmetros específicos, da abordagem dos impactos climáticos em sede de avaliação de impactos e de licenciamentos ambientais no Brasil.


Por fim, é preciso também falar do avanço de ações judiciais e decisões por Tribunais no Brasil que estão exercendo controle jurisdicional relevante para o avanço desta temática da inserção das mudanças climáticas e do tratamento de seus impactos no âmbito de avaliações e estudos de impacto e no processo de licenciamento ambiental, em especial de atividades, empreendimentos e projetos com significativos impactos ambientais e emissões de GEE. São diversas as Ações Civis Públicas com decisões importantes sobre o tema no país.


A integração de medidas de mitigação e adaptação climática no campo dos estudos e avalições de impacto ambiental e sobretudo dos processos de licenciamento ambiental é um caminho sem volta, principalmente em um contexto de economia e mercados atentos à necessária transição energética e descarbonização, em que riscos climáticos se tornam verdadeiros riscos a qualquer atividade econômica. A própria agenda ESG e de sustentabilidade corporativa é outro fator crucial para que a pauta climática se integre com intensidade nos licenciamentos ambientais nos próximos anos, no Brasil e no mundo.


Se o país dependesse da "nova" lei de licenciamento para mitigar impactos climáticos em projetos de petróleo, óleo, gás, mineração e outras atividades com intensivas emissões, afirmaria seu papel de maior potência ambiental "contraditória" do que renovável...


Dadas essas perspectivas de regulamentações em estados do Brasil e da atuação regulatória de órgãos como o Ibama, além das decisões judiciais por Tribunais nacionais, o "vácuo" em termos climáticos existente na "nova" lei geral de licenciamento é de algum modo preenchido, com foco na utilização do mais relevante e estratégico mecanismo de regulação ambiental do Brasil - licenciamento - no combate dos efeitos da emergência climática.


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Artigo originalmente publicado no LinkedIn.

Autor: Bruno Teixeira Peixoto

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