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Regulação ambiental precisa prevenir e combater corrupção e fraude

  • Foto do escritor: Bruno Teixeira Peixoto
    Bruno Teixeira Peixoto
  • 18 de set.
  • 4 min de leitura
Imagem de funcionário do Ibama olhando para árvores derrubadas
Imagem: Vinícius Mendonça/Ibama

Brasil ainda não dispõe de uma política ou regulação estrutural acerca da relação entre proteção do clima e da natureza e a corrupção.


Como se não bastasse a complexidade dos danos à qualidade e à integridade da natureza e do clima, a tutela ambiental e climática cada vez mais é desafiada pelo agravamento de questões estruturais como atos de corrupção e de fraude, que condicionam a concretização de um desenvolvimento sustentável.


Trata-se de uma relação conhecida. Desde 2003 a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, regulamentada no Brasil pelo Decreto Federal n. 5.687 de 2006, em seu artigo 62, item “1”, expressamente dispôs que os Estados-Partes deveriam adotar “disposições condizentes com a aplicação aceitável da presente Convenção na medida do possível, mediante a cooperação internacional, tendo em conta os efeitos adversos da corrupção na sociedade em geral e no desenvolvimento sustentável, em particular1.


Estudos de 20062 e de 20113 da Transparency International já apontavam a relação entre o avanço da corrupção e as questões de meio ambiente e de desenvolvimento sustentável, com reflexos no combate às mudanças climáticas, exigindo, assim, que as políticas e normas ambientais avançassem à época em ações e medidas voltadas a este dilema social, econômico, político e jurídico.

É um contexto previsto pelo próprio Acordo de Paris de 2015, quando em seu artigo 2º, item “1”, alínea “c”, almeja “tornar os fluxos financeiros compatíveis com uma trajetória rumo a um desenvolvimento de baixa emissão de gases de efeito estufa e resiliente à mudança do clima4.


Da mesma forma na Agenda 2030 Global, com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) n. 16 por “Paz, Justiça e Instituições Eficazes“, dadas as suas metas de n. 16.5 e n. 16.6, respectivamente, de “reduzir substancialmente a corrupção e o suborno em todas as suas formas” e “desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis5.


Nesse sentido, em 2019, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) alertou que, embora haja na grande maioria dos países órgãos e leis ambientais, a falta de implementação permanece, o que se deve, entre outros fatores, à corrupção e à falta de políticas de governança e compliance na regulação ambiental6.


Sobre o tema, a Transparency International disponibiliza o atlas global “Climate Governance Integrity Programme7, mapa mundial dos principais casos envolvendo corrupção e fraude ligados à governança ambiental e climática, como uma forma de fomentar a análise de medidas de integridade, transparência e accountability na regulação de meio ambiente e clima.

A despeito de todos esses relatórios e termos de “soft law” internacionalpouco ou quase nada se avançou na regulação ambiental e climática com escopo de prevenir os riscos e combater as práticas concretas de atos de corrupção e toda a sorte de fraudes neste segmento, sobretudo no cenário brasileiro.


No Brasil, há previsões legais esparsas como infração administrativa ambiental por omissão ou falsidade de laudos e estudos ambientais ou então crimes contra a Administração Pública ambiental com efetividade controversa, sem haver uma política ou regulação estrutural específica acerca do tema no país.


Em nível federal, estadual ou municipal, razões para tal abordagem regulatória não faltam: conflitos de interesses, abusos de poder, desvios de finalidade, corrupção, prevaricação ou improbidade administrativa ambiental, para ficar nos exemplos mais evidentes registrados nos atos e procedimentos públicos em geral envolvendo a área ambiental, como autorizações e licenças ambientais de grandes obras, empreendimentos ou atividades econômicas com significativos impactos socioambientais.


Sequer há no PL 2.159/2021 no Senado Federal, ligado à chamada Lei Geral do Licenciamento Ambiental, alguma previsão estritamente voltada a medidas ou mecanismos de prevenção e combate à corrupção e à fraude no âmbito dos licenciamentos ambientais, cujo contexto econômico, social e político de grandes empreendimentos denota evidentes riscos da ocorrência dessas práticas contra o interesse público e, consequentemente, em prejuízo da proteção ambiental, climática e do desenvolvimento nacional sustentável.


Para a Transparência Internacional Brasil, a corrupção ambiental seria o abuso de poder confiado a alguém, visando à obtenção de ganho privado, causando degradação ambiental, enfraquecimento da governança ambiental ou injustiça socioambiental 8. É um dilema importante em um momento em que tanto se discute a responsabilidade ESG (Environmental, Social and Governance) de empresas e organizações no Brasil e no mundo.

Segundo a TI Brasil, seria necessário: 1) aprofundar uma política de dados abertos no monitoramento de infrações e crimes ambientais; 2) fomentar e implementar canais de denúncia com proteção aos denunciantes; 3) desenvolver a governança ambiental sobre o lobby; 4) avançar na regulação de crimes ambientais e lavagem de dinheiro; e 5) estruturar a transparência no financiamento partidário sujeito à corrupção e a influências indevidas em políticas ambientais9.


Uma alternativa seria prever, dentro das exigências em licenciamentos ambientais de atividades econômicas dotadas de grande porte e significativos impactos socioambientais, a implementação de medidas e ações anticorrupção e fraude, como por meio dos programas de integridade e compliance, aliando um controle contínuo da gestão ambiental conexo à prevenção dos riscos e ao combate a atos de corrupção e fraude, correlacionados à estrutura e à atuação dos órgãos ambientais como dos próprios empreendimentos licenciados.

Em boa hora foram inseridas na Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA)10, iniciativa que envolve órgãos e entidades públicas de controle de todos os níveis federativos, ações em 2024 para:


  • aprimorar a rastreabilidade da cadeia produtiva do gado e da madeira com vistas a evitar a corrupção e a lavagem de dinheiro vinculadas ao desmatamento; 

  • elaborar Diretrizes Nacionais de Integridade para prevenção e combate a corrupção e fraudes associadas a empreendimentos com impacto ambiental; e

  • avaliar riscos de integridade no licenciamento ambiental, como forma de prevenir e combater fraude e corrupção.


Em suma, a corrupção, além de poluir e degradar o meio ambiente e o clima, faz da natureza sua vítima silenciosa11, exigindo cada vez mais da regulação ambiental uma nova e melhor abordagem sobre o tema, sob pena de um distanciamento ainda maior do desejado desenvolvimento sustentável em tempos de pós-pandemia e emergência climática.


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Artigo originalmente publicado no LinkedIn.

Autor: Bruno Teixeira Peixoto

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