A hora da Governança Climática no Brasil
- Bruno Teixeira Peixoto

- 19 de set.
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Decisão recente do TCU corrobora para a necessidade de avanços estruturais quanto à governança vinculada às políticas e metas climáticas brasileiras.
No mês de outubro , o Tribunal de Contas da União (TCU) publicou acórdão contendo análises de grande relevância para as discussões das políticas de mudanças climáticas no Brasil. As conclusões afirmam os contornos decisivos que a governança pública (e privada) assume na forma de instrumento-chave ao combate das mudanças climáticas. Em especial tendo no horizonte a realização da COP30 em Belém em 2025.
Segundo o Acórdão nº 2.201/2024, o Plenário do TCU apreciou os resultados obtidos a partir de Auditoria Operacional realizada entre agosto de 2023 e junho de 2024, efetuada para avaliar acerca da governança instituída em âmbito federal para o enfrentamento da crise climática, bem como dos mecanismos de gestão dos recursos financeiros destinados ao tema.
Nada obstante as importantes e estratégicas questões levantadas, o TCU no acórdão ressaltou também que "uma nova governança climática vem sendo construída na Administração Pública Federal desde o início de 2023", afirmando, porém, a necessidade de maior celeridade, atualidade e efetividade à execução, controle e implementação de ações na pauta.
A referida auditoria do TCU teve como escopo analisar o arranjo institucional da Administração Pública Federal à temática, bem como a atuação do centro de governo e dos mecanismos de gestão dos recursos orçamentários e de recursos oriundos de financiamento internacional destinados ao enfrentamento da crise climática no Brasil.
Dentre as principais conclusões apontadas pelo TCU, estiveram: i) a Política Nacional sobre Mudança do Clima - PNMC (Lei Federal nº 12.187/2009) encontra-se desatualizada em relação aos compromissos internacionais recentemente assumidos pelo país; ii) há falhas de articulação do governo federal junto a entes subnacionais e sociedade civil; e iii) limitações quanto à transparência, respectivamente, do gasto público climático no Orçamento Geral da União (OGU) e dos fundos climáticos multilaterais.
Em relação à desatualização da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), as análises indicaram a necessidade de realização de um processo de revisão ou atualização, de modo a refletir os compromissos mais recentes assumidos pelo Brasil no âmbito internacional, sobretudo as disposições atualizadas do Acordo de Paris de 2015 e a incorporação da NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada em inglês) mais recente e fixada pelo Brasil, entre outros ajustes como metas de redução de emissões setoriais, mecanismos de monitoramento e acompanhamento dos resultados e integração dos demais entes federativos.
Ainda neste primeiro item, foram mencionados os Projetos de Lei nº 6.539/2019 e nº 2.118/2023, ambos cujo objetivo é atualizar e aprimorar a Política Nacional sobre Mudança do Clima, à luz do Acordo de Paris e dos cenários mais recentes de emergência climática nacional e internacional. Esta atualização é tema em curso no Congresso Nacional, representando importante questão para melhoria regulatória e organização estrutural voltada à efetiva governança pública sobre mudanças climáticas no Brasil.
Quanto ao item de falhas de articulação entre governo federal, entes federativos e sociedade civil, a decisão do TCU apontou para a necessidade de uma articulação horizontal dentro do próprio governo federal, mas também da consecução de uma mesma articulação em nível vertical, entre os diferentes entes federativos e sociedade civil. Aqui o destaque foi dado ao papel a ser exercido pela União Federal, os Estados, Distrito Federal e os Municípios com foco na implementação e execução dos objetivos da PNMC.
Na articulação da PNMC com a sociedade civil, o TCU reiterou sobre o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC), criado pelo Decreto Federal nº 3.515/2000, e previsto pelo art. 7º da Lei Federal nº 12.187/2009, de que referida instância de articulação entre governo federal, terceiro setor, setor privado e academia, nos últimos anos, necessita de mais evidências de atuação efetiva.
O terceiro e último item das análises do TCU no Acórdão sobre governança climática foi o baixo nível de transparência do gasto climático no Orçamento Geral da União (OGU). Para o TCU, seria necessário aprimoramento no sentido de um levantamento específico visando dimensionar o gasto climático federal, com metodologia para o desenvolvimento de marcadores climáticos no OGU, os quais permitiriam identificar a composição do gasto climático federal e o respectivo montante de recursos, incluindo gastos primários e secundários.
Neste último item, o TCU informou que está em andamento projeto em parceria com o Banco Internacional de Desenvolvimento (BID) a criação de metodologia que possibilite a marcação dos gastos ambientais e climáticos no OGU de forma mais robusta.
Assim, o TCU concluiu por recomendar ao Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM): 1) a instituição de um novo Plano Nacional de Mudança do Clima por meio de um instrumento normativo adequado para garantir a efetiva atribuição de responsabilidades aos órgãos e entidades envolvidas na implementação do plano; 2) o estabelecimento de uma sistemática de monitoramento, avaliação e revisão do novo Plano Clima; 3) a submissão à Casa Civil de uma proposta de atualização da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC); 4) a articulação a integração entre governo federal, estados, Distrito Federal e municípios por meio da Câmara de Articulação Interfederativa; e 5) a avaliação da estrutura e do funcionamento do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC).
Na lição da Profa. Ana Maria Nusdeo, a ideia de governança climática alinha-se à necessária articulação entre diferentes níveis de ação e decisão (global, internacional, nacional, regional e local) e entre diferentes atores (governos, instituições intergovernamentais ou não, empresas, ONGs, academia, entre outros)1. Trata-se do instrumento e instituto da governança aplicada, em macroestrutura e finalidade, especificamente nas articulações de ações de mitigação, adaptação e financiamento ao combate dos efeitos das mudanças climáticas.
Diante das conclusões e recomendações trazidas em momento evidentemente oportuno pelo TCU, cada vez mais relevante é o papel que a governança climática exerce no combate às mudanças do clima em termos de articulação e arranjos institucionais. O desafio da emergência do clima, por natureza, causas e efeitos, exige uma resposta macroestrutural e sistêmica, sem a qual, aponta o próprio TCU, corre-se o risco da ineficácia e do agravamento do cenário de prejuízos em desfavor de toda a sociedade.
Cabe citar que o TCU publicou outra análise de suma importância na pauta climática brasileira, o Acórdão nº 2.379/2024, com o qual constatou que o chamado Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono), voltado à mitigação e adaptação climática no setor de agropecuária, não atingiu seus objetivos, inexistindo no Brasil plano a longo prazo de adaptação na área da agropecuária brasileira. Tema que merece uma nova análise em específico.
Em um momento no qual o Brasil tem pela frente a paradigmática COP30 em 2025, além de ter regulamentado o seu Mercado Regulado de Créditos de Carbono, publicado sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC em inglês) de metas de redução de emissões no Acordo de Paris e aberto consulta pública sobre a Estratégia Nacional de Adaptação do Plano Clima, somados à COP29 de incrementalismos e poucos avanços, torna-se essencial o fomento a maior discussão sobre a estruturação, a implementação e o controle das medidas e ações voltadas à governança de todos estes temas complexos, multisetoriais e fundamentais ao futuro do Brasil e do planeta. Chegada a hora da governança climática acontecer no Brasil.
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Artigo originalmente publicado no LinkedIn em novembro 2024.
Autor: Bruno Teixeira Peixoto



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